MEUS 15 MINUTOS DE FAMA

Se é verdade a máxima de Andy Wahrol de que, um dia, todos terão seus 15 minutos de fama, já tive os meus. E foram bastante engraçados.

Meus familiares e amigos mais próximos sabem, muito bem, que tenho uma certa, digamos, facilidade de fazer imitações. É algo inato, portanto não tenho do que me vangloriar ou me envaidecer. Gosto de, eventualmente, divertir os amigos nas conversas com imitações não só de pessoas famosas, mas de outros amigos, familiares e até algumas personalidades.

"Você sabe imitar o Sidney Magal?” Não entendi imediatamente o porquê da pergunta que minha irmã Célia me fez naquele dia. No final dos anos 70 ou início dos anos 80, a Polícia Militar de Alagoas havia organizado uma gincana estudantil para a qual vários estabelecimentos de ensino de Maceió, mais notadamente os da rede pública, se inscreveram para participar. Dentre eles estava "Juvenópolis”, um complexo assistencial, que desenvolve atividades educativas e ocupacionais e diversos outros tipos de serviços assistenciais, mantido pela Arquidiocese de Maceió e voltado aos jovens carentes e em situação de risco social. Célia era, então, uma das professoras de Juvenópolis. 

Naquela época, Sidney Magal era um pop star que costumava vestir-se com roupas que lembravam a cultura cigana, cabelos negros encaracolados caídos na testa e nos ombros, uma boca com os cantos arreados e um olhar de trivela (Dá para imaginar aquele olhar assim com uma sobrancelha contraída e a outra normal, olhando de baixo para cima?). 

Apesar de ter pouca timidez (para entender isso, sugiro uma leitura de meu artigo Minha Nudez Castigada neste blog), a gente sempre se sente meio desconfortável quando a coisa da imitação não é espontânea. E naquela situação eu teria que fazer a coisa em público!

Daí, eu comecei a arranjar algum pretexto para recusar o convite sem deixar de ser atencioso. Nesse dia eu não posso. Fui convidado para uma festa em Batalha (a 200km de Maceió). Já recebi os convites e confirmei minha presença. Tem até hotel reservado.O convite era verdadeiro. Uma grande amiga de nome Mary Mendes organizara uma festa para comemorar o retorno de sua irmã após um bom tempo nos Estados Unidos e me convidara, juntamente com meu amigo Tião.

Minha desculpa foi inútil. "Não se preocupe: eu mando um carro com motorista te levar lá em Batalha logo após a apresentação, mas você não pode deixar de ajudar as crianças carentes de Juvenópolis!, garantiu-me Marta Azevedo, a esposa do diretor de Juvenópolis que estava à frente da equipe que iria participar da gincana. Mas Marta, eu...”  aí ela me deu um cala-a-boca: “...e ainda lhe dou de presente uma garrafa de whisky Ballantines. O Tião logo virou meu empresário: "Voniney, tá muito boa a proposta! Aceita, cara, esse whisky é muito bom. Adoro Ballantines”. 

Se ter um carro motorista exclusivo me esperando para levar tão longe já fazia me sentir um artista, imaginem vocês como eu não estaria me sentindo com o mimo de uma garrafa de Ballantines 8 anos, o whisky mais caro, mais chique e mais contrabandeado daquela época! Apesar de eu não gostar de whisky, fiquei balançado a aceitar o convite, mas a vergonha de ter que fazer aquilo ainda era enorme. Então, eu logo pensei e me convenci: “Não custa nada ajudar ao meninos carentes de Juvenópolis(ehehe), já imaginando uma  limousine com um chaufer vestido a caráter, levando-me a Batalha após minha “apresentação”! Enfim, não tendo mais saída, eu topei.

Depois de topar a empreitada, os primeiros micos que eu paguei foram por conta de Marta e minha irmã quererem ver se eu realmente sabia imitar o Sidney Magal. Aí, elas insistiram para eu, a contra-gosto, fazer uma breve demonstração da imitação (que mico!) requebrando, agachando, e movendo os braços como numa rumba, e como se estivesse ouvindo a canção! “Quero vê-la sorrir, quero vê-la cantar, quero ver o seu corpo dançar sem parar...!”; Eu era instado a dar uma canja meio acanhada, sem, ao menos, um playback para ajudar.

Foto: Adhemar Veneziano
Mas, para a apresentação ser a melhor possível, eu teria que parecer com o Sidney Magal. Então, eu teria que usar uma peruca cujos cachos fossem iguais ou parecidos com os do cantor original. E as indumentárias também! Magal costumava usar uns cintos largos, de fivela grande, sapatos de salto altos, anéis, às vezes usava umas roupas com mangas de babado e de boca larga, etc. Tudo isso eu teria que usar para o número ser perfeito!

Você não imagina, caríssimo leitor, como eu me arrependi de ter topado essa parada! E minha irmã a cobrar para ver se minha performance tinha melhorado e eu dizia “Deixe comigo. Confie no taco!”.

O grande dia chegou. A gincana ocorreria no ginásio de esportes do CRB, na Pajuçara. Para diminuir a tensão - e a vergonha - eu planejei e combinei com meu staff tomar uns copos de cerveja meia hora antes, de forma que, quando chegasse a hora “H”, eu estaria menos tímido, mais desinibido e com coragem de enfrentar o desafio diante de centenas de pessoas e torcedores adversários hostis presentes no ginásio.

E assim fizemos. Lá pelas 3:30h  da tarde, já anunciavam a próxima prova da gincana: o número da imitação de Sidney Magal! Lá fomos eu, Murilo, Toinho e meu “empresário” Tião para um barzinho nas proximidades do ginásio (ainda sem eu estar caracterizado de Sidney Magal, obviamente) tomar umas cervejas. Tomei uma quantidade suficiente para me dar coragem de enfrentar a prova e me sentia no ponto!

A prova estava prestes a começar. Rapidamente troquei de roupa no banheiro masculino, vesti a calça e a blusa pretas, o cinto com fivela avantajada, a peruca e fui para a arquibancada onde estava a claque de Juvenópolis. Ah, me esqueci de um detalhe: os sapatos! Na construção do personagem Sidney Magal, eu usava um tipo de sapato que a gente chamava de “cavalo-de-aço”, um sapato masculino de salto alto, horrível para os padrões de moda tanto daquela época quanto da atual!

Além dos goles de cerveja, outra coisa que ajudava muito era o fato de eu estar de peruca de cabelos cacheados (Só por aqueles cabelos postiços ninguém me reconheceria!). Poucas pessoas conhecidas presentes ao ginásio saberiam que aquele Sidney Magal era este que vos escreve. 


No meu íntimo, os 15 minutos de fama, na verdade, seriam as duas horas de viagem para Batalha, cheia de mordomias, carrão, motorista e o litro de whisky!

O momento estava se aproximando. Eu, já no primeiro degrau das arquibancadas, todo vestido, emperucado, já aturando a gozação para os membros de meu staff artístico, esperando minha hora, ainda sob o efeito dos copos de cerveja que havia tomado minutos antes. O calor que fazia no ginásio já repercutia em minha roupa e meu rosto brilhava com o suor que escorria.

Eis que, de repente, falta energia no ginásio! Mas eu nem cheguei a me preocupar, achando que em dois ou três minutinhos a energia seria restabelecida e a prova teria reinício. Qual nada! A energia só voltou cerca de 2 horas depois! Putz!

Já voltou tarde para fins de meu plano anti-vergonha, porque o efeito dos copos de cerveja que eu tomara para aliviar a tensão, o nervosismo e o constrangimento escorrera pela minha face, metabolizado em forma de suor. Àquela altura eu já estava 110% sóbrio, para minha infelicidade. E agora?

Bem, eu teria que fazer a imitação no cru, ou seja, subir no palco e “cumprir o contrato” cantando com a voz rasgada “Oh, Eu te Amo, oh, eu te amo meu amor!”, fazer os trejeitos do Sidney Magal, rebolar, dar umbigadas tal e qual um cachorro no coito, do mesmo jeito que o artista fazia. Isso tudo torcendo para que ninguém me reconhecesse.

A apresentação, modesta à parte, foi um sucesso e eu saí obviamente ovacionado (pela nossa claque, claro - e vaiado pela torcida concorrente que me secava injustamente). A nossa equipe não venceu a gincana, mas ficou na segunda colocação, que também era premiada.  E, terminada minha apresentação, feito um artista famoso, saí às pressas do local para trocar de roupa em meu “camarim” (o banheiro masculino do ginásio) e embarcar no carro (que nos meus planos e sonhos deveria seria uma limousine ou um outro carro de classe) que me levaria a Batalha para a grande festa da noite! Meus 15 minutos de fama, afinal!!!!

Entrementes, os 200km percorridos naquela desgraçada, desconfortável e barulhenta Kombi Pé-duro, que exalava um cheiro insuportável de fumaça, chacoalhando nas curvas e buracos da péssima estrada, estragaram todo o glamour do dia e me trouxeram de volta à realidade. ”Que artista fuleiro, eu, hein?”  pensei, resignado. Minha “carruagem” era, na verdade, uma abóbora (quase estragada!).

Vocês podem estar duvidando da veracidade desta história, não é? É óbvio que a gente dá um toque pitoresco e cômico à narrativa. Mas esta história é, sim, uma parte verdadeira de minhas memórias, a qual apenas poucos dos que me conhecem sabem, mas que, com certeza, terão se divertido lendo-a. O cinto e a peruca foram devolvidos à dona (eram femininos, viu?). A calça ainda serviu para eu “tirar uma onda” por algum tempo. Os sapatos cavalo-de-aço ainda resistiram a alguns embalos daqueles longínquos sábados à noite.

Mas eu nunca vou esquecer dos meus efêmeros 15 minutos de fama, pois trago comigo uma prova dessa divertida passagem de minha vida: um registro fotográfico único (vejam abaixo), feita por algum papparazzi desavisado de que aquilo era apenas uma divertida curtição de um jovem que driblava as dificuldades materiais pessoais com bom humor, e não o verdadeiro Sidney Magal!


Foto de autoria desconhecida


VOLNEY AMARAL

Divirta-se curtindo este video (no youtube)  do Renato Aragão imitando Sidney Magal


Comentários

  1. Volninho!
    Já me diverti e sorri muito aqui ao lembrar desse episódio!
    Sua narrativa tá perfeita! Eu tive a felicidade de participar desses momentos e de toda a preparação para que tudo acontecesse dentro dos conformes.
    Você deu show!
    Na época, porque além de nos premiar com sua apresentação, diga-se de passagem "perfeita", deu uma grande contribuição para a Instituição.
    E agora, ao relatar com tanta veracidade e riqueza de detalhes uma parte de sua história que tenho certeza, só o engradece como pessoa e demonstra o grande ser humano que você é.
    Parabéns meu irmão!!!!

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    1. Celinha, você e sua amiga Marta (viúva do ex-reitor da UFAL João Azevedo) foram as grandes artífices daqueles momentos que os meninos carentes de Juvenópolis tiveram ao participar da gincana. Obrigado por estar presente nessa e em outras passagens engraçadas de nossas vidas! Bjos.

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  2. Me diverti pra caramba mesmo!!! rsrsrsr
    mais uma das suas qualidades hem!Percebo que vc além de fazer imitações é também um ótimo humorista (pelo menos nasnarrações).rsrsrs

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    1. Minha amiga Antônia, que bom tê-la de volta ao nosso site, divertindo-se com essas narrativas. Vem mais por aí. Um abraço e obrigado por sua assiduidade e prestígio ao nosso blog.

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  3. Brilhante! Apesar de já saber desta história, esta sua narrativa inseriu-me no contexto dela, de modo tão real que,mesmo não estando presente, vivenciei os seus momentos, os temores e vibrei com as gargalhadas e palmas. Só tem uma coisa, se você levar a diante esta história de fama, eu serei a sua empresária desta vez, combinado? Mesmo que não tenha ballantines (rsrsrs)

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    1. Minha querida esposa, veja só com quem você foi casar!!!!! KKKKKK

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  4. LUIZ CARLOS - BRASÍLIA18 de abril de 2012 às 00:57

    Se esta não for a melhor, é certamenta a mais engraçada entre as histórias que eu já li aqui neste blog. Acabei de ler agora, às 00:56 da madruga, no meu plantão no Aeroporto de Brasília. Não consegui parar de rir. E a foto é impagável.Verdadeira prova de como tem gente corajosa neste mundo.

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    1. Luiz Carlos, que bom que tu madrugada possa ter sido um pouco divertida com esta história. Agora, quero permissão para contar a sua história do hospital. É super hilária! Ou então, conte você mesmo. E nos mande um convite. Cadê seu blog, cara? E quando vem a Maceió? Estamos com saudades.

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  5. Amigo querido,
    Que fantástico poder estar aqui viajando nessa tua história...e muito bacana também saber que faço parte das tuas doces lembranças e mais, justamente em um "dia de glória" teu. (risos)Parabéns!!! Me diverti MUITO com todas as descrições que fizestes e deve ter sido muito hilário tudo isso.
    Deus no brinda com essas recordações de tempos diferentes...parabéns a tua mana e os amigos que estiveram do teu lado para apoiar, incentivar, fazendo aflorar o teu jeito brincalhão para o público, certamente issocontou como um rico aprendizado.
    Registro aqui a minha admiração por ti blogueiro amigo querido e saudades dos nossos tempos idos. Ah! a propósito gostaria de saber um pouco como foi a experiência da festa. (risos) Mary Stimamiglio (Mendes)

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    1. Gente, 3 persnagens citados nesta história já comentaram. Mary Stigmamiglio (na época Mary Mendes), que hoje mora em Santa Catarina. Mary, um beijo para você, minha amiga de sempre. Depois te contarei da festa e de nossa hospedagem no Lúcia Hotel. Lá também teve coisa engraçada. Célia, minha irmã (quem primeiro comentou acima) e o meu "empresário" Tião, que postou seu comentário no Facebook, assim dizendo:"Mto bom meu irmãozinho me diverti pra caramba, pra falar a verdade estava torcendo q vc escrevesse sobre essa aventura da gente. Faltou contar a história da ida a Pão de Açúcar e depois a epopéia da volta de carona!!!!"

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  6. Grande Volney,
    Além de grande amigo e excelente profissional você tem demonstrado a brilhante habilidade de nos divertir com seus grandes causos em uma época de ouro. Parabéns!
    Luiz Alfredo Ribeiro Costa

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    1. Luiz Alfredo, você também tem suas histórias hilárias!!!! Acompanhe sempre os artigos do blog, divulgando-o e comentando os artigos. Compartilhe-o com seus contatos do Orkut, Linkedin, Facebook, Badoo, rsrsrsrs

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  7. Tio Volney, ri muito aqui com essa história.. kkkkkkk
    fico imaginando o senhor caracterizado de Sidney Magal.
    A foto ficou um barato!

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  8. DR. VOLNEY E AFINAL O TIÃO TOMOU OU NAO O whisky Ballantines?KKKKK.

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    1. Na verdade, essa garrafa de whisky foi muito lentamente e especialmente consumida nos meses que se seguiram...

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  9. Volninho, cada dia mais me surpreendo com sua criatividade...Mas imitar Sidney Magal? Só um grande amor por Celinha o levariam a participar com tanto brilhantismo.E o Tião?Tomou o Whisky Ballantines na famigerada viagem para Batalha?E as fotos, hem?

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    1. Prezada conterrânea Márcia. Somente hoje (18/02/2014), revendo este artigo de meu blog é que percebi seu comentário! Obrigado por comentar. Adoro seguir, curtir e comentar seus post no Facebook. Recebi 2 exemplares do livro lançado por seu irmão Giuseppe, inclusive 1 com dedicatória. Essa história é realmente divertida. Meu "empresário" Tião compartilhou comigo os tragos do Ballantines! Valeu! Um bjo. Saúde!

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  10. Muito bem contada a sua aventura. Mas eu gostaria mesmo de assisti-la ao vivo - kkkkk. Nem consigo imaginar!!

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    1. Eu era magrinho!!! Você não me reconheceria. Tempos bons, aqueles. Obrigado pela visita.

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