SAIO DO ARMÁRIO


Advertência: contém assunto e linguagem inapropriados para menores de 12 anos.

Dizem que todo homem tem algo de feminino, de mulher. Já que está na moda "sair do armário", vou confessar: eu também tenho um lado feminino. Calma! Vou explicar tin-tin por tin-tin no final deste artigo. 

Está cada vez mais complicado a gente compreender as coisas destes tempos modernos. Nas últimas décadas tivemos que mudar uma série de conceitos, inventar uma centena de palavras para definir novas situações, novas práticas, novos costumes. Vou dar um exemplo.

No ano passado ocorreu, de verdade, um fato para lá de inusitado, pelos menos para mim. Vi numa reportagem na tv sobre esse curioso caso que ocorreu em um restaurante em São Paulo. Depois, li alguns artigos sobre esse caso para checar os detalhes. Eu jamais ouvira falar nisso antes!

Uma senhora e sua jovem filha, uma menina de 10 anos de idade, foram ao toilet (obviamente o toilet feminino) de um determinado restaurante paulistano, quando, de repente, em seu interior se depararam com um... com uma... é... é... (Como é que eu digo isso mesmo?) ... com... com... com uma figura, pronto! Permitam-me usar o termo figura porque não dá para definir com precisão o que elas viram. 

Pois bem, tratava-se essa figura de um ser da espécie humana, aparentemente do gênero masculino, vestido como se fosse um ser do gênero feminino. Essa figura era ninguém mais, ninguém menos, que o talentoso e genial cartunista Laerte, que assina uma coluna de cartoons na Folha de São Paulo, de cuja arte cartunista sou fã de tirinha. 

Confesso, como eu disse lá em cima, que não sabia dessa, digamos, é..., é... (Gente, como é difícil escolher um termo para usar neste artigo...) ... sua preferência (Não, "preferência" não...), ("Doença" eu sei que não é...) essa sua mania ("mania" também não...), essa sua extraordinariedade, (ufa! Achei um termo, finalmente!) (Ainda assim não está perfeito, mas deixa prá lá).

A ciência conceitua isso como sendo um "transtorno de identidade de gênero", ou seja, a pessoa é de um gênero (ou sexo), mas tem o desejo de viver e ser aceito como sendo do gênero oposto ao de seu nascimento. O que difere isso de outro tipo de extraordinariedade é que a pessoa que tem o "transtorno de identidade de gênero" diz-se hétero, inclusive o genial cartunista Laerte.

Não sou indiferente, pois compadeço-me com as pessoas que têm esse tipo de conflito interno. Não deve ser fácil ser minoria, ser diferente, ser extraordinário, principalmente em questões como a sexualidade. Quer se sentir assim por alguns instantes? Vá a uma cerimônia formal - um casamento, por exemplo - usando um short de banho e calçando sandálias, em vez de terno e gravata!

Naquele impasse ocorrido no toilet do restaurante paulistano, as duas mulheres (aqui dá para definir mais facilmente a mãe e a filha) se sentiram extremamente constrangidas, é claro! 

Sem outra alternativa, a mãe, - já viram, não é? -, sacou um “Socorro, chamem o gerente!". Coitado do gerente! Até um homem se sentiria constrangido numa situação daquela. Quando chegou para acodi-las, dava para ver aquela interrogação deste tamanho (estou aqui fazendo o gesto com as mãos) acima de sua cabeça
, como quem se perguntava: "Que peste é isto?!"

E agora, como resolver esse impasse? Laerte, pasmem, se veste de mulher mas se diz e se considera hétero também. Ou seja, gosta de mulher! E se averbou no direito de se vestir como quisesse e se achar como quisesse, fazendo uso de sua liberdade de expressão.


Com seu senso de humor incomum, Laerte disse que, em represália, vai promover um banheiraço, um protesto contra essa coisa careta de se rotular banheiro de restaurantes e afins.

Se a liberdade de expressão chegar a todo ponto, e com as transformações comportamentais cada vez mais versáteis em busca do prazer e da felicidade, mutatis mutandi, um sujeito (especialmente um ou uma artista que estiver meio esquecido pela mídia) que somente se realizar sexualmente, por exemplo, com animais de outra espécie (aqui não estou falando de outro gênero da mesma espécie, mas de outra espécie), vai voltar à cena ao se declarar apaixonado(a) por seu dog alemão de estimação ou seu cavalo manga-larga, quem sabe com intuito de união estável, e direito a pensão previdenciária, e o escambau. Não vai faltar deputado para elaborar um projeto de lei nesse sentido.


Se for para acomodar apropriadamente todas essas tribos em toilets de bares, restaurantes e outros locais públicos, vai faltar letra no nosso alfabeto. Terão de sair do monótono "M" (de masculino), e "F"  (de feminino), para acrescentar à sopa de letrinhas  "G" (gays), "L" (lésbicas), "B" (de bissexuais) "T" (transtornados), "Z" (Zoossexuais), e por aí vai! Ou, se quiser simplificar, "O" (genericamente para "Outros"). 

A busca pela felicidade inclui como compreensíveis todos os meios de se sentir prazer, inclusive o sexual. Afinal, prazer é sinônimo de felicidade. Mas senti-la é algo muito subjetivo, e rotular os outros sem considerar aspectos variáveis é apenas uma faceta da natureza humana; é julgar sem provas e sem defesa. Neninho, um amigo meu  do Trapiche, costumava dizer, com muita propriedade, que entre um homem e uma mulher vale tudo, até determinadas práticas que a natureza masculina rotularia de prática homossexual, sem, no entanto, fazer desse homem um homossexual, já que ele estaria se relacionando com alguém do sexo oposto.

Veja que eu rotulei a busca pela felicidade como algo "compreensível". Dá para se rotular quase tudo. Mas não dá para rotular certas coisas como "normais", quando, aqui e na China, elas jamais serão normais: são meramente "toleráveis", "compreensíveis" - porém indignas de preconceito. E todos, inclusive os que sofrem com esse preconceito, precisam, também, tolerar os demais, os outros, sem rotulá-los de preconceituosos! 

Para terminar, e cumprindo minha promessa feita lá em cima, eu confesso: 

Tenho, sim, um lado feminino. Mas meu lado feminino é lésbico! Ou seja, só gosta de mulher! 

Pronto. Dou-me por satisfeito por estar, agora, do lado de fora do armário.

VOLNEY AMARAL

Comentários

  1. Só espero que você continue gostando de vinho tinto seco. Nem pense em me chamar para tomar uma garrafa de rosé no Palato. Noves fora, você continua escrevendo cada vez melhor, dentro ou fora do armário.

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  2. KKKKKKKKKK Continuo curtindo vinho seco!!!! E não chamo o Facebook de "Face", pois, segundo um amigo meu, homem que é homem não tem "Face" (é muito delicado). Homem tem "Facebook", segundo ele! Adotei a forma. rsrsrrs

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