Hoje registro, ainda que intempestivamente, mas pesaroso, o destino que nossas autoridades, com a ajuda da
população mal educada e inconsequente, deram ao Riacho Salgadinho: sua morte!
Na verdade, ele jaz, há décadas, como um cadáver putrefato e insepulto de um indigente, esquecido no coração de nossa bela cidade de Maceió, como se estivesse à espera de um rabecão do IML que jamais chegará.
Dá nojo
trafegar nas ruas que o margeiam, outrora morada de famílias distintas e abastadas em seus belos casarões.
Dá nojo até olhar para a cor negra e a consistência de suas vísceras (aquilo não é água) acossadas por
urubus que disputam algo ininteligível em meio às garrafas PET, as
fraldas de bebês usadas e outras imundícies inominadas.
Dá nojo e náuseas inalar o ar fétido que rondeia a língua negra que desemboca, como sangue talhado, na corrente marinha.
O Salgadinho, além de vidas, já ceifou milhões em dinheiro público em projetos mirabolantes e obsoletos.
Ceifou, também, uma das mais curtidas diversões públicas e gratuitas de nossa cidade: a Praia da Avenida, cuja presença rarefeita de coqueirais era compensada pelas águas límpidas e um tapete de uma areia alva e fininha por toda a extensão de sua forma côncava que se estendia desde o Cais do Porto, em Jaraguá, até os confins do Pontal da Barra.
Ceifou a famosa prévia carnavalesca que se chamava "Banho de Mar à Fantasia", os passeios ao coreto, as peladas que se estendiam até o Trapiche da Barra.
Ceifou a fartura da vida marinha que nos proporcionava assistir aos pescadores jogando e recolhendo suas redes de arrasto, sempre plenas de siris, peixes, lulas, camarões. Ceifou vidas que alimentavam vidas.
E, como se isso nada tivesse a ver com a gente, porque simplesmente moramos no Farol, na Ponta Verde ou longe daquele riacho morto, nós simplesmente deixamos passar o tempo, os anos, a história, os governos, nossos filhos e netos, sem sequer levantar a voz contra essa indiferença criminosa de nossas autoridades.
Não quero morrer sem antes ver o Riacho Salgadinho ressuscitado, inodoro, desassoreado; com moleques novamente dando saltos mortais e mergulhando em suas águas nas pontes do bairro do Poço; com gente pescando piabas ou bagres em suas margens; com as peladas na Praia da Avenida; com os Banhos de Mar à Fantasia; com os pescadores e suas redes de arrasto de volta à sua paisagem de fim de tarde.
VOLNEY AMARAL
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