OLINDA - O CARNAVAL DOS MEUS SONHOS

Na época de jovem universitário, sempre sonhei em passar o carnaval em Olinda. Mas sempre aparecia algum problema que me impedia de ir. Geralmente era problema de grana curta. Mas eu nunca esquentei a cabeça por isso. Sempre sustentei meu sonho de me esbaldar naquelas ladeiras históricas e de esticar a folia até a saída do bloco "Bacalhau do Batata", após o tríduo momesco oficial.

As coisas foram melhorando paulatinamente até que, um dia, eu me vi com grana para passar o carnaval em Olinda. Não existia curtição melhor que aquela festa naquelesidos dos anos 80. Somente o carnaval de Salvador competia com o de Olinda.

Um belo dia, Marco Aurélio, o galeguinho mais carimbado do Trapiche, com quem eu saía muito frequentemente naquela ápoca, me fustigou para irmos para o carnaval de Olinda. Eu topei e decidimos ir para lá. "A gente vai no meu carro. Só precisa rachar a gasolina e lá a gente se vira. Vai ser a maior curtição", disse o galeguinho, experiente frequentador de todas as bibocas onde tinha cerveja, viola e garotas para azarar. Olinda era o lugar perfeito para isso naquela época.

Eu só tinha um receio: viajar para Olinda no FIAT 147 de Marco Aurélio era algo de alto risco. Não pela estrada, mas pelo estado do carro.

Marco Aurélio possuía um FIAT 147 da cor mais sinistra que existia: era um marrom fechado, tipo marro-caixão-de defunto. O carro, que de há muito pedia um banho de loja e de oficina, ou até mesmo um simples com água mesmo era um horror de sujeira e desarrumação por dentro. A rigor, não sei como aquele FIAT 147 conseguia passar incólume em uma renovação de licenciamento.

Meu maior receio era que, numa freada mais brusca, eu pegasse tétano na lataria do FIAT 147 de Marco Aurélio!



O Fiat 147 de MArco Aurélio era um pouco melhor que este.
Foto copiada da web (1)
Sem mentira alguma, do interior do carro dava para ver o asfalto passando por sob o carro, tamanho eram os buracos que a maresia do Trapiche fizera na chapa do assoalho do seu FIAT 147. "Só falta agora a gente ter que fazer o carro andar como os Flintstones: botar o pé na estrada literalmente, Galeguinho", zombei dele.

Então vamos a Olinda! E lá saímos, eu e Marco Aurélio, rumo ao vizinho estado de Pernambuco realizar o meu tão sonhado desejo de passar aquele carnaval com muita cerveja, alegria e garotas...  

No final da tarde do sábado de Zé Pereira, tomamos a estrada litorânea AL 101. Depois, seguiríamos pela PE 060 no seu trajeto até Recife-Olinda.

Estávamos ainda no décimo inicial de nosso trajeto, passando por Paripueira, cidade de veraneio do litoral norte de Alagoas, onde já tínhamos passado dezenas de carnavais com nossos amigos. Paripueira tinha um carnaval muito legal, mas era Olinda que me fascinava naquela época, pelo sei ineditismo para mim, o que a tornou meu objeto de desejo naquela oportunidade.

Nem o cheiro forte de gasolina queimada, denunciante do CO² resultante da combustão, que infestava o interior do carro de Marco Aurélio, que entrava pelos furos da carroceria e assoalho mercê do vácuo que o deslocamento do veículo proporcionava, tirava nossa animação.

Paripueira já estava ficando para trás e já passávamos do Acampamento Batista, cujo campo de futebol margeia a estrada, quando o FIAT 147 começou a inguiar. O cano de escape do pequeno automóvel soltou uns quatro tiros e o motor do veículo apagou, forçando nosso estacionamento à margem da rodovia.

"É bronca safada", disse Marco Aurélio, querendo anunciar que com um pequeno ajuste o FIat 147 pegaria de novo e já antevendo minha frustração. No entanto, ele não conseguiu fazer o carro "pegar" de novo, passados já uns 30 minutos de tentativas. A tarde já se despedia e a noite começava a tomar conta do dia, quando resolvemos procurar um socorro mecânico de vergonha.

Quem disse que num sábado de carnaval os mecânicos de Paripueira trabalham? Estavam todos enchendo a cara nos blocos de rua, melados de talco Gessi, ou Arrozina ou Maizena, cantando as marchinhas carnavalescas já cinquentenárias. "Mamãe eu quero, mamãe eu quero..."

Para piorar a situação, o tempo fechou e caiu um dos maiores torós de verão daquela época. Não perdemos a pose. "Amanhã a gente encontra um mecânico. Vamos curtir um pouco essa noite aqui em Paripueira. E logo cedo a gente estará partindo para Olinda", sugeriu Marco Aurélio.

Encontramos muitos amigos que estavam passando o carnaval em Paripueira e logo apareceram ofertas de bilhetes para o baile do clube de Paripueira, ponto alto do carnaval daquela cidade, onde a festa era organizada e tinha muita gente boa. Em Paripueira nos sentíamos em casa. 

O carnaval de Paripueira estava tão bom, que na Quarta-feira de cinzas já ao meio dia, quando acordamos ressacados é que demos conta de lembrar do FIAT deixado à beira do caminho! Confesso que, pelo amor que Marco Aurélio tinha pelo seu carro, ele temeu que o mesmo tivesse sido levado por ladrões, ou depenado, se é que isso era possível!

Mas, ao nos dirigirmos à rodovia e ao nos aproximarmos do local onde deixáramos o carro 4 dias antes, Marco Aurélio suspirou aliviado ao avistar seu carro no mesmo local. 

Estava com o vidro aberto, como, aliás, ele tinha deixado porque a calha do vidro já andava quebrada há muito tempo, com os mesmos 4 pneus carecas que ardiam no asfalto quente há meses e com o tanque de gasolina intacto (em 1/4)! Quem iria querer roubar um carro naquele estado?

O carnaval de Olinda ficou mesmo só no sonho. Até hoje não completamos aquela viagem para Olinda.  

VOLNEY AMARAL

(1)  http://www.todomercado.com/tm/aviso/img_avisos/1306882564291_1306882834252_jotacarlos.jpg


Comentários

Postar um comentário